segunda-feira, 5 de março de 2018

Uma nova mulher





Quando o fundo do poço foi meu chão,
Com a força da mulher persistente
Calejada pelas batalhas da vida
Olhei para o alto e vi a Luz,
Segui seu rastro e emergi.
Cobri minha nudez de sonhos
Com estampas florais e coloridas,
Vesti meu melhor sorriso,
Cortei meus excessos, cabelos e aflições.
Pintei meus lábios, vermelho bordô,
Subi no salto, vi mais longe.
Usei o melhor perfume
Para o meu próprio deleite.
Olhei a nova mulher no espelho.
Amável e receptiva, soltei minha voz:
Prazer em conhece-la.

Zezinha Lins




sexta-feira, 2 de março de 2018

Que tiro foi esse?



Quando o monstrinho nasceu, ele era apenas um anjinho. Inocente, meigo, totalmente dependente como todos os anjinhos. Ele tinha uma caixinha vazia, lá seus pais e familiares deveriam ao longo do tempo, depositar valiosos tesouros. Porém, as pessoas naquela casa que estava longe de ser um lar, estavam desguarnecidas de tesouros, e ninguém oferece o que não tem. Não contaram nada para o anjinho sobre: cidadania, respeito, solidariedade, amizade, carinho, amor, poesia...
O anjinho foi crescendo com sua caixinha vazia. Sentia que lhe faltava algo, algo que ele não conhecia. Em casa, via TV até tarde, não havia rotina, nem deveres a cumprir. Quando começou a sair sozinho, conheceu muita gente e começaram a encher sua caixinha. Não sabendo distinguir entre tesouro e lixo, recebia tudo que pudesse preencher seu vazio.
Metamorfose. O anjinho aos poucos virou monstrinho. E assim foi rotulado na escola e por onde passava. Na sua caixinha havia tanto lixo que derramava por onde ele andava. Contaminava e era contaminado pelo lixo de outros monstrinhos.
O tempo passou, o monstrinho cresceu e se transformou num monstro gigante, sua caixa também cresceu, agora não precisava de ajuda para continuar a enchê-la de lixo, ele já sabia como fazer isso sozinho, aprendera a lição.
Certo dia, no beco escuro onde morava sozinho, um barulho ecoou bem perto. E os vizinhos olhando um para o outro, sem espanto nem estranhamento se perguntaram: - Que tiro foi esse?


Zezinha Lins                             

quinta-feira, 1 de março de 2018

Outono


Em plena transição
Contemplo meu ser,
Perfeita sintonia,
Outono em mim.
Nua, despojada dos excessos,
Roupas espalhadas como folhas secas pelo chão,
Resisto.
Vejo-me árvore de raízes fortes.
Sinto a ousadia do vento
Que canta no silêncio da noite,
Primorosa sinfonia
Adentra a janela entreaberta,
Acaricia meu corpo,
Afago in natura.
Hora de troca de roupagem, de cor, de sonhos.

Meu amor se foi com o Sol,
Dispenso a melancolia
Tão própria da nova estação,
Prefiro a beleza escondida no misterioso amanhã.
Há surpresas por vir,
Há leveza na nudez que espera
Um arrepio na pele
Quando a longa e fria noite chegar.
Enquanto isso, buscarei a mim mesma,
Marcarei encontro com o Sol.
Mas sei...
Um novo outono virá
Com toda a magia da última colheita.
Serena, em recolhimento
Escreverei entre os lençóis
Mais um poema de amor.




Zezinha Lins